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terça-feira, junho 15, 2004

Adeus 

Não houve despedida! Não houve o aceno do adeus, o abraço nem o beijo. Naquele momento nenhum de nós queria despedir-se e ainda assim saibamos que o afastamento era inevitável. Apesar de não existir a promessa nem o compromisso, recusávamos aceitar que teria de ser assim, que um dia as nossas vidas seguiriam separadas.
Lembro-me que adiaste a partida por dois dias. Os únicos de que pudeste dispor só para nós e que soubemos aproveitar segundo a segundo. Lembro-me dos sítios onde estivemos das coisas que foram ditas para nunca mais serem repetidas. Lembro-me da roupa que usámos, do perfume que escolhemos.
O Outono trouxe a nostalgia que lhe é própria e a tua Primavera não foi como aquelas que antecedem o Verão.
Podíamos ter escolhido de forma diferente? – pergunto-me muitas vezes! Não sei responder e mesmo que soubesse acho que preferiria negar qualquer que fosse a resposta.
Sinto saudades, muitas saudades. Não sei se é de ti ou da minha vida daquela altura ou, ainda, do que esperava e desejava que viesse a acontecer. Não sei se as saudades são do que vivemos ou do que ficou por viver. Mas são saudades reacesas de uma história em que tu és o herói. São saudades que vão permanecer e que me custam suportar.
No princípio as cartas, que não chegavam sempre no mesmo dia mas vinham todas as semanas, minimizavam a ausência. Subia feliz no elevador com o envelope na mão, tentando adivinhar o que vinha lá dentro. As palavras os souvenirs, as fotografias, davam-me uma inexplicável, ainda que efémera, alegria. Lia e relia. Não precisava de ler nas entrelinhas – coisa boa – porque tudo vinha nas linhas. Tentava fixar o que estava escrito para me ir lembrando até à chegada da próxima. Depois eram os raros mas longos telefonemas. A voz que ficava parada depois do bom dia minha querida com que gostavas sempre de começar mesmo quando me sentias estremunhada por acabar de acordar e sabias que corria a madrugada.
Também gostava da parte em que sabia que olhávamos para a lua ao mesmo tempo. Lembro-me que recomendavas que fizesse uma rotação do olhar à volta da lua para assim termos a certeza de que os nossos olhares se cruzavam. Seguia as instruções com o rigor que pedias para não correr o risco de falhar. Que mau que era quando as nuvens impediam este ritual.
O tempo foi passando e habituámo-nos à ausência e à distância. Deixámos que outras pessoas se aproximassem, preenchessem o lugar, e passámos a ter de lhes dedicar algumas das coisas que tínhamos só para nós porque o contrário não era justo.
Hoje, como antes, não me apetecia despedir de ti. O meu olhar ficou preso no teu daquela maneira tão profunda que, como costumavas dizer, dá até para ver o jantar da véspera.. Quis soltá-lo e mesmo sendo meu, não dominei. Vi nos teus olhos o brilho de um rio pronto a alagar as margens e assustei-me porque nos meus corria água da mesma nascente.
Hoje repetimos as palavras daquele Outono. Abraçamo-nos e dissemos adeus. Deixámos transparecer sem vergonha a tristeza que se misturou com a alegria de estarmos juntos. Foi dito e feito o que ainda faltava.
Demos as mãos, fizemos projectos e promessas e unimos os desejos.
O beijo! Ficou a faltar o beijo.

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